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O bebê engasgou…
Mais um caso de engasgamento… Era uma tarde como todas as outras, eu estava em frente ao computador na sala de regulação de um dos SAMUs onde trabalhei e o telefone tocou, era a proprietária de uma creche informando que uma de suas crianças havia engasgado e não respirava… “Doutor, ela está roxa!!!”. Imediatamente liberei a ambulância de suporte avançado de vida, tripulada com médico e enfermeiro e com equipamento de unidade de terapia intensiva.
“A senhora conhece os procedimentos básicos de primeiros socorros?”, perguntei para a solicitante que infelizmente respondeu de maneira negativa… Em caso de engasgamento é necessário que o acompanhante da vítima inicie imediatamente as manobras de desobstrução das vias respiratórias pois caso contrário, na grande maioria das vezes, a ambulância chegará apenas para constatar o óbito. A cada minuto que se passa sem receber oxigênio o cérebro perde 10% de chance de sobreviver, assim, em 10 minutos sem respirar podemos dizer que muito provavelmente a pessoa já esteja em morte cerebral… Entretanto caso o oxigênio volte a alimentar o sistema nervoso central após quatro ou seis minutos, apesar de vivo, a pessoa engasgada ficará com graves sequelas neurológicas que a impedirão de desfrutar de uma vida normal… Imagine isso no futuro de um bebê…
Engasgamento. O que fazer?
“A senhora tem alguém para ajudá-la?”, questionei novamente, ela respondeu que sim, havia sua mãe a qual a ajudava nessa creche, uma senhora de 78 anos, que também não conhecia os procedimentos para salvar a vida da criança. Pedi que ela abrisse a porta para a equipe imediatamente e se posicionasse de modo que facilitasse a chegada do socorro, em seguida orientei: “Coloque a criança de barriga para baixo e a segure com apenas um braço, coloque o rosto dela em sua mão e abra os dedos de modo que a boca fique com a passagem livre, deixe a cabeça do bebê mais baixo em relação ao corpo, em seguida golpeie as costas dela com cinco tapas vigorosos, em seguida vire a criança, inspecione a boca e comprima o centro do tórax com os dedos indicador e médio também cinco vezes, repita isso até a criança chorar ou começar a se movimentar, eu estarei contigo aqui no telefone”… Penso que esse é um procedimento extremamente importante e que todos devem conhecer, entretanto é muito difícil de ser explicado ou mesmo aprendido por telefone no momento do desespero…
Infelizmente todas as vezes que recebo uma solicitação de engasgamento explico a manobra de desengasgamento, é o melhor que um médico regulador pode fazer estando do “outro lado do telefone”, mas sempre escuto que os procedimentos para salvar a vida não são conhecidos, claro pois em nosso país em não existe preocupação em aprender primeiros socorros.
“Crianças que choram são crianças felizes”
Nessas ocasiões sempre torço para escutar o choro da criança, consigo escutar os tapas que orientei e a respiração ofegante do solicitante, de desespero, entretanto poucas são as vezes que tenho a alegria de escutar o choro, pois como uma vez me disse um paramédico norte americano, “crianças que choram são crianças felizes”, pelo menos nesse caso, na maior parte das vezes o tempo vai se passando e a minha frustração vai aumentando, sempre assisto o mesmo filme em minha mente, o das famílias inconformadas quando o médico informa a notícia do falecimento do bebê, uma tragédia…
Escutei a chegada da minha equipe, “doutor, eles chegaram”, disse a solicitante, desligo o telefone e começo a torcer para que os esforços da equipe de suporte avançado sejam eficientes, entretanto após uma hora de trabalho o médico da equipe que está no local informa o horário do falecimento… Diz também que na chegada a solicitante estava fazendo os procedimentos orientados pelo telefone, entretanto de maneira inadequada, foram 12 minutos de deslocamento da base até a creche e na avaliação inicial a criança não respirava e havia muito leite nas vias aéreas…
O retorno da equipe médica
Ao chegar na base, a equipe estava com um semblante de muita tristeza, mas essa tristeza era somada a alguma revolta pois a creche não possuia os elementos necessários para a segurança das crianças, era algo improvisado, uma casa adaptada sendo a proprietária a pessoa responsável por cuidar das crianças e contava apenas com a ajuda da mão, uma idosa de 78 anos.
Era uma instituição que cobrava mensalidade mais barata que as outras, e certamente por isso também havia limitação da estrutura física e de recursos humanos, assim como essa escolinha existem muitas semelhantes espalhadas pelo país e são muito atrativas para famílias de baixa renda que necessitam desses lugares para que as mães possam trabalhar… As pessoas não pensam que essas coisas podem acontecer, imagino o desespero e a revolta da família quando recebeu a notícia de que a criança deixada pela manhã na creche havia morrido devido ao engasgamento com leite…
Importantes reflexões:
- Conhecimento a respeito das técnicas de desengasgamento;
- Importância dos pais conhecerem o preparo da escola dos filhos para situações de emergência (os professores ter curso de primeiros socorros? Existe kit de primeiros socorros disponível?);
- Importância dos pais em verificar as licenças necessárias para o funcionamento destas instituições.